“Se a oração enfraquece, a fé morre”
“Vive-se como se reza”
(Palavras de um sábio, de um santo: Santo Agostinho).
Então:
Vive-se bem quem reza bem
O Santo Agostinho chegou a ser um bispo muito influente na
sua época.
Viveu na Hiponia, entre os anos 354 e 430.
Hiponia: é uma cidade antiga que se localizava ao norte da
Argélia. Hoje não tem mais Hiponia.
Ele criou-se num ambiente mixto. Já que o pai de Agostinho
era pagão e sua mãe cristã. Coisa que influenciou sua vida.
Falar de Santo Agostinho é falar de uma vida transformada pela
fé de uma mãe que orava incessantemente, para manter acesa a esperança e nos deixar o exemplo de que em Deus, através da oração tudo pode ser transformado pela força da fé
Jesus encontraria hoje uma fé verdadeira no seu coração? Foi isso que ele encontrou no coração de Santa Mônica. Uma fé que lhe foi transmitida desde cedo e que cresceu com o tempo e com a prática das virtudes cristãs em meio a muitas dificuldades.
Além da tristeza pelo filho que parecia se afastar cada dia mais de Deus, santa Mônica sofria com o esposo que tinha uma personalidade muito forte que poderia chegar a ser agressivo. Ela dizia: “Quando meu marido está de mal humor, eu me esforço para estar de bom humor. Quando ele grita, eu me calo. E como para brigar precisam de dois e eu não aceito a briga...não brigamos.” Essa luta ela também acabou vencendo pela oração com a Graça de Deus quando seu esposo também se converteu.
Por esses motivos Santa Mônica é a padroeira das mães e esposas católicas. Vendo seu exemplo, todas as mulheres de hoje que passam por situações muito difíceis na família, podem se aferrar ainda mais à oração com a confiança de que Deus fará justiça logo, quando encontre a fé correspondente no coração. Lembremos o que disse Jesus: “Em verdade vos digo que, se tiverdes fé como um grão de mostarda, direis a este monte: Passa daqui para acolá, e há de passar; e nada vos será impossível.” (Mateus 17, 20)
http://www.a12.com/redacaoa12/espiritualidade/santa-monica-a-forca-da-oracao-de-uma-mae
Nas “Confissões” de Santo Agostinho ou o “Colóquio de Óstia”. Hoje em dia se diria o
“diálogo de Óstia”.
Vejamos: a mãe de Santo Agostinho, Santa Mônica (331–387),
passou uns trinta anos ou mais chorando a pedir a Deus a conversão de seu
filho. Parecia que quanto mais ela rezava, esta conversão se tornava mais
longínqua. Até que, de desatino em desatino, Santo Agostinho começou um
processo de conversão que fez dele o grande Doutor da Igreja.
Santo Agostinho, já convertido, e Santa Mônica resolveram
voltar para a África do Norte, naquele tempo inteiramente romana, e mais
especificamente para a cidade de Cartago, de onde eram naturais, para ali
residirem. E assim percorreram uma certa parte da Itália para tomar um navio em
Óstia, que é um porto pequeno perto de Roma, mas que tinha naquele tempo uma
certa importância. De lá iam seguir para a África.
Encontravam-se numa hospedaria de Óstia, encostados
junto a uma janela e começaram a conversar a respeito de Deus e das coisas do
Céu, quando os dois juntos tiveram um êxtase.
O diálogo aconteceu provavelmente numa dessas janelas
Santo Agostinho relata este colóquio extraordinário e é um
dos trechos mais famosos das “Confissões”. Poucos dias depois Santa Mônica
morria, ainda estando na cidade de Óstia. Sua missão na terra estava cumprida e
Nosso Senhor a chamou ao Céu para gozar do prêmio que merecia.
Então, o último lance de sua vida foi exatamente a alegria de
ter na terra com o filho este colóquio, que era um prenúncio, um antegozo da
visão beatífica. Tenho a impressão que qualquer um de nós que passasse por
Óstia, gostaria de ver se ainda existe essa hospedagem.
O relato de Santo Agostinho:
“Próximo já do dia em que ela ia sair desta vida - dia que Vós conhecíeis e nós ignorávamos...”
Estas interpelações diretas de Santo Agostinho a Deus são
magníficas. Todos nós deveríamos ler os “Solilóquios” de Santo Agostinho, que
são edificantes.
“...sucedeu, segundo creio, por disposição de Vossos secretos desígnios, que nos encontrássemos sozinhos, ela e eu, apoiados a uma janela cuja vista dava para o jardim da casa onde morávamos. Era em Óstia, na foz do Tibre, onde, apartados da multidão, após o cansaço duma longa viagem, retemperávamos as forças para nos embarcarmos.
“Falávamos a sós, muito docemente, esquecendo o passado e dilatando-nos para o futuro. Na presença da Verdade, que sois Vós, alvitrávamos qual seria a vida eterna dos santos, que 'nunca os olhos viram, nunca o ouvido ouviu, nem o coração do homem imaginou'.”
Vejam que beleza: dois santos conversando sobre qual seria a
vida eterna dos santos, e a alegria de Santa Mônica em sentir aquele filho
perdido que agora estava incendiado de desejos de contemplar o Céu. É uma
verdadeira maravilha!
“Sim, os lábios do nosso coração abriam-se ansiosos para a corrente celeste da nossa fonte, a fonte da Vida, que está em Vós, para que aspergidos segundo a nossa capacidade, pudéssemos de algum modo pensar num assunto tão transcendente.”
(“os lábios do coração”... quer dizer, aquilo por onde o
coração bebe, por onde o coração sorve, estavam abertos para receber de Deus
aquilo que nesta vida terrena se pode receber a respeito das alegrias do Céu).
“Encaminhamos a conversa até a conclusão de que as delícias dos sentidos do corpo, por maiores que sejam e por mais brilhante que seja o resplendor sensível que as cerca, não são dignas de comparar-se à felicidade daquela vida, nem mesmo que delas se faça menção. Elevando-nos em afetos mais ardentes por essa felicidade, divagamos gradualmente por todas as coisas corporais até ao próprio céu, donde o sol, a lua e as estrelas iluminam a terra.”
É uma verdadeira procura do absoluto. Eles começaram a
considerar: primeiro as coisas da terra, que lisonjeiam os sentidos, porque
estavam no Império Romano decadente, em que havia fortunas fabulosas e pessoas
que tinham luxo para deleitar os sentidos. Então, o primeiro confronto é da
felicidade celeste para a felicidade dos homens, que no tempo do Império, eram
tidos como felizes. Então, começam a perguntar: como é então (a felicidade
verdadeira)? E começam a percorrer os céus, a imaginar com os dados do céu
material e visível, como seria o paraíso celeste material, mas invisível, e
como seria a glória da visão beatífica que neste paraíso se goza. É este o
esquema da conversa deles. Então continua:
“Subíamos ainda mais em espírito, meditando, falando e admirando as Vossas obras. Chegamos às nossas almas e passamos por elas para atingir essa região de inesgotável abundância, onde apascentais eternamente Israel com o pastio da verdade. Ali a vida é a própria Sabedoria, por Quem tudo foi criado, tudo o que existiu e o que há de existir, sem que ela própria se crie a si mesma, pois existe como sempre foi e como sempre será. Antes, não há nela 'ter sido', nem 'haver de ser', pois simplesmente ‘é’, por ser eterna.”
(Ou seja, depois de ter considerado todas as coisas
materiais, começaram então a considerar a alma como elemento para se ter algo
da ideia da beleza, da perfeição de Deus. E depois de considerar a alma,
chegaram à conclusão de que no ápice de tudo isto figurava a Sabedoria Eterna.
Essa Sabedoria que é eterna, que não tem passado, nem presente e nem futuro.
Foi nessa consideração sapiencial, suprema, que os espíritos deles se detiveram).
“Enquanto assim falávamos, anelantes pela Sabedoria... “...atingimo-la momentaneamente num vislumbre completo do nosso coração. Suspiramos e deixamos lá agarradas as primícias de nosso espírito.”
(Quer dizer, o que havia de melhor neles ficou na visão, não
voltou para a terra).
(É o êxtase. Enquanto conversavam a respeito dessas coisas,
conduzidos pela graça de Deus, em certo momento a Sabedoria se revelou a eles,
e tiveram um fenômeno místico por onde viram Deus).
(Parece natural, uma conversa entre mãe e filho, mas mão é,
são dois santos que estabelecem um diálogo com Deus, uma conversa que é uma
oração; esta vai subindo de voo, de ponto em ponto, e quando chega ao seu
ápice, então lhes aparece Deus Nosso Senhor, mas aparece de maneira a fazê-los
conhecer enquanto Sabedoria Eterna. E tudo isto com tanta simplicidade, numa janela de uma hospedaria de Óstia...)
“...Voltamos ao vão ruído dos nossos lábios, onde a palavra começa e acaba. Como poderá esta, meu Deus, comparar-se ao Vosso Verbo, que subsiste por si mesmo, nunca envelhecendo e tudo renovando?”“Dizíamos pois: suponhamos uma alma onde jazem em silêncio a rebelião da carne, as vãs imaginações da terra, da água, do ar e do céu...”
É a doutrina dos quatro elementos.
“Suponhamos que ela guarde silêncio consigo mesma, que passa para além de si, nem sequer pensando em si; uma alma na qual se calem igualmente os sonhos e as revelações imaginárias, toda a palavra humana, todo o sinal, enfim, tudo o que sucede passageiramente.
“Imaginemos que nessa mesma alma existe o silêncio completo, porque se ainda pode ouvir, todos os seres lhe dizem: ‘Não nos fizemos a nós mesmos, fez-nos O que permanece eternamente’. Se ditas estas palavras os seres emudecerem, porque já escutaram quem os fez, suponhamos então que Ele sozinho fala, não por essas criaturas, mas diretamente, de modo a ouvirmos a sua palavra, não pronunciada por uma língua corpórea, nem por voz de Anjo, nem pelo estrondo do trovão, nem por metáforas enigmáticas, mas já por Ele mesmo.
“Suponhamos que ouvíamos Aquele que amamos nas criaturas, mas sem o intermédio delas, assim como nós acabávamos de experimentar, atingindo num voo de pensamento, a Eterna Sabedoria que permanece imutável sobre todos os seres”.
(Quer dizer, ele imagina uma alma que não cogita de nada mais
criado, que consegue abstrair de tudo e que de repente ouve uma palavra de Deus
que diz alguma coisa a respeito de Si próprio).
“Se esta contemplação continuasse e se todas as outras visões de ordem muito diferente cessassem, se unicamente esta arrebatasse a alma e a absorvesse, de modo que a vida eterna fosse semelhante a este vislumbre intuitivo - a visão beatifica - pelo qual suspiramos, não seria isto a realização do “entra no gozo do teu Senhor”? E quando sucederá isto? Será quando todos ressuscitarmos? Mas então não seremos todos transformados? ”
(Ele afirma então que se uma alma pudesse ficar eternamente
apenas naquele vislumbre, já teria um prazer paradisíaco inefável,
extraordinário).
“Ainda que isto, dizíamos, não pelo mesmo modo e por estas palavras, contudo, bem sabeis, Senhor, quanto o mundo e os seus prazeres nos pareciam vis, naquele dia quando assim conversávamos. Minha mãe acrescentou ainda: ‘Meu filho, quanto a mim, já nenhuma coisa me dá gosto nesta vida. Não sei o que faço ainda aqui, nem porque ainda cá esteja, esvanecidas já as esperanças deste mundo. Por um só motivo desejava prolongar um pouco a minha vida: para ver-te cristão e católico, antes de eu morrer. Deus concedeu-me esta graça superabundantemente, pois vejo que já desprezas a felicidade terrena para servirdes ao Senhor. Que faço, eu, pois, aqui?’”
Dias depois ela morreu.
(Santa Mônica, nesta visão, teve o prenúncio de sua própria
morte, compreendeu que não tinha nada mais para fazer.
As palavras desse diálogo foram tiradas de um artigo de Plínio Correa de Oliveira:
O colóquio de Santo Agostinho
com Santa Mônica em Óstia
e a procura do Absoluto
e a procura do Absolutohttps://www.pliniocorreadeoliveira.info/DIS_SD_650831_StaMonica_StoAgostinho_Ostia.htm
Santo Agostinho, diria depois:
“Mas estendeste tua mão do alto, e arrancaste minha alma deste abismo de
trevas, enquanto minha mãe, tua fiel serva, chorava-me diante de ti muito mais
do que as outras mães costumam chorar sobre o cadáver dos filhos, pois via a
morte de minha alma com a fé e o espírito que havia recebido de ti. E tu a
escutaste, Senhor, tu a ouviste e não desprezaste suas lágrimas que, brotando
copiosas, regavam o solo debaixo de seus olhos por onde fazia sua oração; sim,
tu a escutaste, Senhor.”
Recortes de: O essencial sobre Santo Agostinho, por Bento XVI
Gostaria de (...) falar (...) do maior Padre da Igreja
latina, Santo Agostinho: homem de paixão e de fé, de grande inteligência e
incansável solicitude pastoral, este grande santo e doutor da Igreja é muito
conhecido, pelo menos de fama, também por quem ignora o cristianismo ou não tem
familiaridade com ele, porque deixou uma marca muito profunda na vida cultural
do Ocidente e de todo o mundo. Pelo seu singular relevo, Santo Agostinho teve
uma influência vastíssima, e poder-se-ia afirmar, por um lado, que todas as
estradas da literatura latina cristã levam a Hipona (hoje Annaba, à beira-mar
da Argélia), o lugar onde era Bispo e, por outro, que desta cidade da África
romana, da qual Agostinho foi Bispo de 395 até à morte em 430, se ramificam muitas
outras estradas do cristianismo sucessivo e da própria cultura ocidental.
Raramente uma civilização encontrou um espírito tão grande,
que soubesse acolher os seus valores e exaltar a sua intrínseca riqueza,
inventando ideias e formas das quais se alimentariam as gerações vindouras,
como ressaltou também Paulo VI: "Pode-se dizer que todo o pensamento da
antiguidade conflui na sua obra e dela derivam correntes de pensamento que
permeiam toda a tradição doutrinal dos séculos sucessivos" (AAS 62, 1970,
p. 426). Além disso, Agostinho é o Padre da Igreja que deixou o maior número de
obras. O seu biógrafo Possídio diz: parecia impossível que um homem pudesse
escrever tantas coisas durante a vida. Falaremos destas diversas obras num
próximo encontro. Hoje a nossa atenção concentra-se sobre a sua vida, que se
reconstrói bem pelos escritos, e em particular pelas Confessiones, a
extraordinária autobiografia espiritual, escrita em louvor a Deus, que é a sua
obra mais famosa. E são precisamente as Confessiones agostinianas, com a sua
atenção à interioridade e à psicologia, que constituem um modelo único na
literatura ocidental, e não só, também não religiosa, até à modernidade. Esta
atenção à vida espiritual, ao mistério do eu, ao mistério do Deus que se
esconde no eu, é uma coisa extraordinária sem precedentes e permanece para
sempre, por assim dizer, um "vértice" espiritual.
Mas, falando da sua vida, Agostinho nasceu em Tagaste na
Província de Numídia, na África romana a 13 de novembro de 354, filho de
Patrício, um pagão que depois se tornou catecúmeno, e de Mónica, cristã
fervorosa. Esta mulher apaixonada, venerada como santa, exerceu sobre o filho
uma grandíssima influência e educou-o na fé cristã. Agostinho recebeu também o
sal, como sinal de acolhimento no catecumenato. E permaneceu sempre fascinado
pela figura de Jesus Cristo; aliás, ele diz que amou sempre Jesus, mas que se
afastou cada vez mais da fé eclesial, da prática eclesial, como acontece hoje
com muitos jovens.
Agostinho tinha também um irmão, Navígio, e uma irmã, da qual
não sabemos o nome e que, tendo ficado viúva, chefiou depois um mosteiro
feminino. O jovem, de inteligência aguda, recebeu uma boa educação, mesmo se
nem sempre foi um estudante exemplar. Contudo ele estudou bem a gramática,
primeiro na sua cidade natal, depois em Madaura, e a partir de 370 rectórica em
Cartago, capital da África romana: dominava perfeitamente a língua latina, mas
não conseguiu dominar do mesmo modo o grego nem aprendeu o púnico, falado pelos
seus conterrâneos. Precisamente em Cartago Agostinho leu pela primeira vez o
Hortensius, um escrito de Cícero que depois se perdeu, o qual está na base do
seu caminho rumo à conversão. De facto, o texto de Cícero despertou nele o amor
pela sabedoria, como escreverá, já Bispo, nas Confessiones: "Aquele livro
mudou verdadeiramente o meu modo de sentir", a ponto que "de repente
perdeu valor qualquer esperança vã e desejava com um incrível fervor do coração
a imortalidade da sabedoria" (III, 4, 7).
Mas estando convencido de que sem Jesus não se pode dizer que
se encontrou efetivamente a verdade, e dado que neste livro apaixonante lhe
faltava aquele nome, logo após tê-lo lido começou a ler a Escritura, a Bíblia.
Mas ficou desiludido. Não só porque o estilo latino da tradução da Sagrada
Escritura era insuficiente, mas também porque o próprio conteúdo lhe pareceu
insatisfatório. Nas narrações da Escritura sobre guerras e outras vicissitudes
humanas não encontrava a altura da filosofia, o esplendor de busca da verdade
que lhe é próprio. Contudo, não queria viver sem Deus e assim procurava uma
religião que correspondesse ao seu desejo de verdade e também ao seu desejo de
se aproximar de Jesus. Caiu assim na rede dos maniqueus, que se apresentavam
como cristãos e prometiam uma religião totalmente racional. Afirmavam que o
mundo está dividido em dois princípios: o bem e o mal. E assim se explicaria
toda a complexidade da história humana. Agostinho apreciava também a moral
dualista, porque implicava uma moral muito alta para os eleitos: e para quem,
como ele, a ela aderia, era possível uma vida muito mais adequada à situação do
tempo, sobretudo para um homem jovem. Portanto, tornou-se maniqueu, convencido
naquele momento de ter encontrado a síntese entre racionalidade, busca da
verdade e amor a Jesus Cristo. E teve também uma vantagem concreta para a sua
vida: de facto, a adesão aos maniqueus abria perspetivas fáceis para fazer
carreira. Aderir àquela religião que contava muitas personalidades influentes
permitia-lhe prosseguir a relação estabelecida com uma mulher e continuar a sua
carreira. Desta mulher teve um filho, Adeodato, por ele muito querido, muito
inteligente, que estará depois presente na preparação para o batismo junto do
lago de Como, participando naqueles "Diálogos" que Santo Agostinho
nos transmitiu. Infelizmente o jovem faleceu prematuramente. Professor de
gramática aos vinte anos na sua cidade natal, regressou cedo a Cartago, onde
foi um brilhante e celebrado mestre de rectórica. Todavia, com o tempo,
Agostinho começou a afastar-se da fé dos maniqueus, que o desiludiram
precisamente sob o ponto de vista intelectual porque não esclareceram as suas
dúvidas, e transferiu-se para Roma, e depois para Milão, onde na época residia
a corte imperial e onde obtivera um lugar de prestígio graças ao interesse e às
recomendações do prefeito de Roma, o pagão Símaco, hostil ao Bispo de Milão,
Santo Ambrósio.
Em Milão Agostinho adquiriu o costume de ouvir inicialmente
para enriquecer a sua bagagem retórica as lindíssimas pregações do Bispo
Ambrósio, que tinha sido representante do imperador para a Itália setentrional,
e pela palavra do grande prelado milanês o rectórico africano sentiu-se
fascinado; e não só pela sua rectórica, sobretudo o conteúdo atingiu cada vez
mais o seu coração. O grande problema do Antigo Testamento, da falta de beleza
rectórica, de elevação filosófica resolveu-se, nas pregações de santo Ambrósio,
graças à interpretação tipológica do Antigo Testamento: Agostinho compreendeu
que todo o Antigo Testamento é um caminho rumo a Jesus Cristo. Encontrou assim
a chave para compreender a beleza, a profundidade também filosófica do Antigo
Testamento e percebeu toda a unidade do mistério de Cristo na história e também
a síntese entre filosofia, racionalidade e fé no Logos, em Cristo Verbo eterno
que se fez carne.
Em breve tempo Agostinho deu-se conta de que a literatura
alegórica da Escritura e a filosofia neoplatónica praticadas pelo Bispo de
Milão lhe permitiam resolver as dificuldades intelectuais que, quando era
jovem, na sua primeira abordagem aos textos bíblicos, lhe pareciam
insuperáveis.
À dos escritos dos filósofos Agostinho fez seguir-se a
leitura renovada da Escritura e sobretudo das Cartas paulinas. A conversão ao
cristianismo, a 15 de agosto de 386, colocou-se no ápice de um longo e
atormentado percurso interior, do qual falaremos noutra catequese, e o africano
transferiu-se para o campo a norte de Milão, nas proximidades do lago de Como
com a mãe Mónica, o filho Adeodato e um pequeno grupo de amigos a fim de se
preparar para o batismo. Assim, aos trinta e dois anos, Agostinho foi batizado
por Ambrósio a 24 de abril de 387, durante a vigília pascal, na Catedral de
Milão.
Depois do batismo, Agostinho decidiu regressar à África com
os amigos, com a ideia de praticar uma vida comum, de tipo monástico, ao
serviço de Deus. Mas em Óstia, à espera de partir, a mãe improvisamente adoeceu
e pouco mais tarde faleceu, dilacerando o coração do filho. Regressando
finalmente à pátria, o convertido estabeleceu-se em Hipona para ali fundar um
mosteiro. Nesta cidade da beira-mar africana, apesar das suas resistências, foi
ordenado presbítero em 391 e iniciou com alguns companheiros a vida monástica
na qual pensava há tempos, dividindo os seus dias entre a oração, o estudo e a
pregação. Ele desejava estar só ao serviço da verdade, não se sentia chamado à
vida pastoral, mas depois compreendeu que a chamada de Deus era para ser pastor
entre os outros, e oferecer assim o dom da verdade aos demais. Em Hipona,
quatro anos mais tarde, em 395, foi consagrado Bispo. Continuando a aprofundar
o estudo das Escrituras e dos textos da tradição cristã, Agostinho foi um Bispo
exemplar no seu incansável compromisso pastoral: pregava várias vezes por semana
aos seus fiéis, apoiava os pobres e os órfãos, cuidava da formação do clero e
da organização de mosteiros femininos e masculinos. Em pouco tempo o antigo
rectórico afirmou-se como um dos representantes mais importantes do
cristianismo daquele tempo: muito ativo no governo da sua diocese com notáveis
influências também civis nos mais de 35 anos de episcopado, o Bispo de Hipona
exerceu grande influência na guia da Igreja católica da África romana e mais em
geral no cristianismo do seu tempo, enfrentando tendências religiosas e
heresias tenazes e desagregadoras como o maniqueísmo, o donatismo e o
pelagianismo, que punham em perigo a fé cristã no Deus único e rico em
misericórdia.
E a Deus se confiou Agostinho todos os dias, até ao extremo
da sua vida: atingido por febre, quando havia três meses que Hipona estava
assediada pelos vândalos invasores, o Bispo narra o amigo Possídio na Vita
Augustini pediu para transcrever em letras grandes os salmos penitenciais
"e fez pregar as folhas na parede, de modo que estando de cama durante a
sua doença os podia ver e ler, e chorava ininterruptamente lágrimas
quentes" (31, 2). Transcorreram assim os últimos dias da vida de
Agostinho, que faleceu a 28 de agosto de 430, quando ainda não tinha completado
76 anos. Dedicaremos os próximos encontros às suas obras, à sua mensagem e à
sua vicissitude interior.
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