O Valor da Vida Humana
Ser contra a pena de morte não é
defender criminoso. É defender a vida, seja lá de quem for. O Cristianismo nos
ensina que “Deus faz nascer o Seu sol
sobre maus e bons e derrama chuva sobre justos e injustos” (Mateus 5, 45b).
Para Deus a vida humana seja lá de quem for tem o mesmo valor, afinal, todos
são filhos e tem em si a possibilidade de se redimirem se, se voltarem para Deus,
isto é, admitirem os próprios erros e mudarem de vida.
Na realidade, a pena de morte é
uma pena aplicada a indivíduos que estão lesando o bem comum de uma sociedade e
esses indivíduos se encontram em condições de impossibilidade de serem remidos,
porque não se arrependem e nem irão se arrepender e assim devem ser retirados
da sociedade.
O Catecismo da Igreja Católica em
seu artigo 2267 não exclui o recurso da pena de morte, mas depois de cabalmente
comprovada a culpabilidade, mas só no caso de ser a única via para defender uma
vida humana ameaçada por um agressor injusto, e ainda acrescenta que devem lançar mãos de outros meios que evitem o
derramamento de sangue porque estes correspondem melhor às condições concretas
do bem comum e estão mais em conformidade com a dignidade humana. Portanto, se
há outros recursos para retirar esse indivíduo da sociedade devem ser aplicados
ao invés da pena de morte, onde há derramamento de sangue.
A origem da pena de morte remonta
1750 a.C., na Grécia Antiga, onde não
se dispunha de recursos e sistemas de controle, portanto é um sistema arcaico
de punição bárbara, dissonante com sociedades modernas e democráticas e que se
dizem desenvolvidas. O respeito pela vida humana deve ser um valor absoluto a
defender em todas as circunstâncias. E o direito à vida, e à liberdade já está
registrado Universalmente desde o Século passado (1948) com a proclamação da Declaração
Universal dos Direitos Humanos pela Assembleia Geral das Nações Unidas, no Artº
3 º.
No estágio em que o mundo
desenvolvido se encontra tem-se que pensar “outras formas” de punição para
manter distante um indivíduo nocivo à sociedade.
Considerando ainda, a aplicação
da pena de morte como ocorre nos países em que ela é aplicada há que se
questionar os aspectos culturais, religiosos radicais e sistemas ditatoriais
injustos, como por exemplo países islâmicos (principalmente a Síria, Paquistão,
Iraque), onde atualmente são promovidas execuções de cristãos com a acusação
pelo Estado Islâmico de blasfêmia. Há ainda o caso, na Somália de uma menina de
treze anos que foi apedrejada até a
morte, só pelo fato de ter sido abusada sexualmente e isto diante de uma assembleia
de assistentes (nem tenho coragem de compartilhar as imagens que me causam horror).
Acrescenta a estes casos o caso que ficou conhecido no Irã da jovem que foi
enforcada por matar o seu agressor que tentou abusá-la sexualmente. E em todos
esses casos houve julgamento e condenação.
Mas a crueldade da pena de morte
ainda é mais bárbara na China, e, mesmo com proibições do governo local de
divulgar, ainda assim algumas imagens são tiradas onde milhares de pessoas são
executadas. A China é um exemplo de que a pena de morte é usada como instrumento
ditatorial de controle do Estado, das mais diversas formas, muitas das vezes
apenas para eliminar dissidentes.
São muitos os aspectos aos quais
devemos nos questionar quando afirmamos ser a favor da pena de morte e o mais
importante deles é que não há Sistema Judiciário infalível, não há sistema
judiciário e criminal no planeta que não esteja sujeito a erros. Temos que
considerar os casos reincidentes de pessoas inocentes, condenadas injustamente,
por não conseguirem provar sua inocência, e isto é bem comum. No site da BBC há
um artigo em que mostra um caso de uma pessoa (Glenn Ford, de 64 anos), nos EUA,
estado da Louisiana que ficou 25 anos no corredor da morte e acabou sendo
inocentado.
Um estudo da Universidade de
Michigan indica que um a cada 25 condenados à morte nos EUA é inocente.
O ponto é que a justiça é falha.
Todo dia se tem notícia de pessoas presas por engano, que as vezes são
inocentadas 1 dia depois, ou 1 ano, ou 10 anos depois. O problema é que a pena
de morte, após aplicada, não tem como se reverter. Não tem como ser
recompensada. É irreversível.
A Encíclica
Evangelium Viter n 56 – Papa João Paulo II, afirma, considerando a falibilidade
dos sistemas judiciais que a pena de morte “não” deve ser aplicada, uma vez que
ela não representa a justiça.
Apesar de ser legítima (se considerar
o fato de se ter que escolher a quem deve preservar a vida do criminoso,
armado ou da vítima, desarmada). Nesses casos nós sempre tendemos a defender a
vida daquele que se encontra em condição desfavorável, no caso a vítima. Assim,
vida por vida, pode nos “parecer” que a vida da vítima é mais valiosa e tendemos
a fazer do criminoso, uma vítima como paga dos seus atos. No entanto, isto é um
retrocesso nas relações humanas e de extrema violência, é como justificar a
prática de um ato violento ilegal, por um tão violento quanto o ato praticado,
só que desta vez praticado legalmente.
A pena de morte faz vítimas as
famílias que carregam esse trauma pelo resto de suas vidas, porque enceram
todos os recursos e priva a família do condenado de sonhar com o resgate da
humanidade do seu familiar e a desesperança é um castigo tremendo que trás um
lastro de dor e sofrimento. Por isso não podemos defender a Lei da Pena de Morte
sem antes refletirmos sobre as implicações da prática dessa lei sobre a vida
das pessoas.
É fato que vivemos uma cultura de
morte no mundo atual, onde canais de comunicação e a mídia em geral tende a
exacerbar a violência e a vingança tanto pública quanto privada. Assim, a
sociedade, “sem um olhar mais apurado” sobre o problema, tende a ver nas penas
aplicadas, e com isso na pena de morte, ou mesmo na antecipação da idade penal
uma forma de aliviar os problemas sociais, os mais diferentes. Os problemas
sociais tem suas origens no desrespeito à dignidade humana e se todos fossem
tratados igualmente, certamente que muitos problemas inexistiriam.
No discurso do Papa Francisco na
Associação Internacional de Direito Penal, dia 23 de outubro de 2014, ele
se declarou como inaceitável para um cristão apoiar a pena de morte, e considera
a prisão perpétua, como uma "pena de morte dissimulada". O Papa
defende a evangelização, o despertar da fé nos detentos condenados a prisão
perpétua e conclama a todos os cristãos e os homens de boa vontade a lutar não
somente pela abolição da pena de morte legal, ou ilegal, e em todas as suas
formas, mas pela dignidade humana das pessoas privadas da liberdade.
A delinquência tem as suas raízes nas
desigualdades econômicas e sociais, nas redes de corrupção e do crime
organizado. E não basta termos leis justas, mas também é necessário construir
pessoas responsáveis e capazes de as pôr em prática. Devemos querer uma justiça
que seja humanizadora, genuinamente reconciliadora, que leve o delinquente para
um caminho de reabilitação social e total reinserção na comunidade.(Papa
Francisco - VATICANO, 23 Out. 2014).
O egoísmo humano faz com que as
pessoas abastadas vejam o delinquente como uma pessoa que escolheu ser
delinquente por conta própria apenas, não o vê como um ser diferente de si, um
ser, que embora tenha os mesmos sonhos de consumo que a mídia passa igualmente
a todos, lhe são negadas oportunidades de ter acesso a eles, e excluídas estão
completamente vulneráveis de ser aliciadas em crimes, por grandes empresas mafiosas.
Veja quantos jovens perdem a vida no tráfico de drogas ilícitas. As pessoas entram
no crime muitas e muitas vezes por falta de oportunidade de trabalho e renda, e
acabam por perderem o controle sobre a sua própria vida, e quanto mais elas
conhecem o grupo para o qual trabalham mais vulneráveis se tornam, e acabam por
se tornarem “escravas” de traficantes poderosos. E quando são presas pela
polícia suas famílias são ameaçadas de morte e, então elas se calam e assumem
toda a culpa pagando elas mesmas pelos crimes de toda uma corporação. Por isso
não podemos julgar em causa alheia, não sabemos o que está por trás.
Por isso não podemos ser a favor da pena de morte, não temos o conhecimento das razões que a pessoa entrou no crime, tampouco das razões que continua nele.
Por isso não podemos ser a favor da pena de morte, não temos o conhecimento das razões que a pessoa entrou no crime, tampouco das razões que continua nele.
https://anistia.org.br/noticias/indonesia-primeiras-execucoes-sob-novo-presidente-sao-um-retrocesso-para-direitos-humanos/
Assim, ao invés de aplaudirmos o Sr.
Joko Widodo, Presidente da Indonésia por ter eliminado um bandido do nosso
meio, assassinando-o, devemos repudiar esse presidente que se julga o bonzinho da
história, que se julga o deus das vidas dos outros.
https://anistia.org.br/noticias/anistia-internacional-pede-que-brasileiro-nao-seja-executado-na-indonesia/
Se temos de um lado a pena de morte
na qual se pune e acaba com a vida, a prisão perpétua não é menos cruel, pois
mantém a vida, mas inicia-se uma agonia que durará toda a vida. Estas
considerações foram feitas por um detento da Prisão de Pádua, na Itália e
editadas em um artigo intitulado: Diálogo
entre um prisioneiro e o Papa. (http://www.aleteia.org/pt/sociedade/artigo/dialogo-entre-um-prisioneiro-e-o-papa-5342397370204160). O
editor do artigo em questão, LA FONTANA
DEL VILLAGGIO, encontrou ressonância nas palavras do Papa ditas no
discurso de 23 de Outubro de 2014 e decidiu compartilhar as palavras de um
detento, que lhe foram transmitidas pelo Padre Fabio Bartoli, com quem troca
cartas.
Dentre outras coisas este detento (Carmelo Musumeci), chamado de “um homem sombra” revela que a prisão
perpétua é uma pena de morte em gotas. As palavras desse detento, me chocam profundamente e me fazem repensar a
minha forma de “pensar” legislar em causa alheia, veja:
Um homem sombra: Muitas vezes estou cansado de fazer bater o
meu coração entre quatro paredes, prisioneiro no fundo do abismo, ferido por
homens de corações sujos e de ficha penal limpa. Cansado de estar fechado e só,
sem esperança, seguindo sonhos, sonhando acordado. Cansado de ser somente uma
sombra que vive no escuro e espera a morte, mas continua procurando
a vida e a luz. Cansado de existir, de escutar os meus lamentos que
me penetram, me dilaceram, me destroem. (Escrito por LA FONTANA
DEL VILLAGGIO)
Não sou e nunca fui a favor da
pena de morte, mas eram por razões que tem fundamentos em minhas convicções
cristãs, mas depois de tudo o que li sobre o assunto e compartilho aqui tenho
mais que uma motivação religiosa para ser contra a pena de morte – ela é o
expoente máximo da punição cruel, desumana e degradante. E se antes eu
era a favor da prisão perpétua, hoje estou mudando de opinião, depois de ler as
palavras do Papa Francisco e as declarações do detento, Carmelo Musumeci ao Padre
Fabio Bartoli, certamente em visita a este detento. Não posso defender
algo tão degradante para um ser humano mesmo que ele mereça pagar por seus crimes. A sociedade a meu ver
tem de repensar um Sistema de Justiça capaz de reconstruir a pessoa e não de
livrar-se dela, assassinando-a de uma vez ou lentamente.
É verdade que somos feitos a cada
dia e cada acontecimento sinaliza para o nosso aperfeiçoamento como pessoa. E ninguém pode se eximir do fato de que é o
responsável por suas escolhas de como defender suas convicções e viver a
própria vida, mas há algo que devemos estar atentos em nossos juízos: não ser coniventes com o mal. Contudo, a
nossa coerência é posta a prova quando defendemos algo mal como a pena de morte
e a antecipação da idade penal e assistimos a pessoas comuns como todas as
pessoas, como nós mesmos serem mortas não só por praticarem crimes hediondos,
mas pelo fato de não terem a sorte de nascer em um lar que contribua para a sua
formação como pessoa idônea, ou, então porque a sua origem pobre e excluída,
pela falta de oportunidade, não lhe é permitida a dignidade que merece. Será
que eu sou mais digna, que mereço a vida mais do que aquele que tira a minha
vida para ficar com o que é meu, que eu sempre tive e até esbanjo e ele nunca
pôde sonhar em ter? Ou será que o bandido, seja ele traficante, estuprador ou
assassino deve ser punido com a morte só pelo fato ser um criminoso ou é por
que aqueles que cultuam a morte dos outros tem medo de serem os alvos de
criminosos.
De qualquer forma as estatísticas
respondem que a pena de morte não contribui para reduzir a criminalidade. Mais
de 80% dos 67 especialistas incluídos em um estudo nos EUA concluíram que a
pena de morte não reduz crimes.
Estudos feitos
nos EUA e Canadá dizem que a aplicação da pena de morte, ao invés de tornar a
sociedade mais segura, tem exercido um efeito nefasto na sociedade. A pena de
morte serve apenas para legitimar o uso da força pelo estado e perpetuar o
ciclo de violência.
Considerando a possibilidade e a
natureza irreversível da pena de morte, todos deveriam pensar duas vezes nas consequências
de apoiar um sistema falho que pode levar à morte um inocente. Afinal, imagine
se fosse seu pai ou sua mãe, sua irmã ou seu filho…
Se você continua ainda a favor da
pena de morte apesar das razões que foram colocadas aqui só espero que nunca
assista a um amigo ou conhecido seu no corredor da morte. Inocente ou não todo
ser humano deseja viver. Mas a vida é mais bela se temos e cultivamos bons
sentimentos. Os bons sentimentos aliado às boas ações podem transformar o mal
em bem e pessoas más podem se tornar boas se induzidas ao bem. Todos nós
podemos ser induzidos, ninguém está a salvo neste quesito.
Geovani
27/01/2015
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